O corpo e os discursos: dominação e segregação nos laços encarnados
Autores
Ana Laura Prates Pacheco
FCL-SP
Resumo
Resumo: Este artigo sustenta-se na doutrina lacaniana dos quatro
discursos para mostrar que o laço social entre os seres humanos é um
“laço encarnado”, já que o corpo humano é também fato de discurso.
Esse “laço encarnado”, entretanto, não se dá sem conflito, já que implica
relações de poder que resultam em dominação e segregação. Mostrase
a continuidade entre corpo e cosmos durante a Idade Média, época
em que predominava o discurso do Mestre. Propõe-se que durante o
Renascimento, na transição desse discurso para o Discurso Universitário,
o corpo da mulher ofereceu resistência, o que se evidencia pelo sintoma
social da fabricação de cadáveres nas fogueiras da inquisição. Mostra-se
que, a partir do século XVII, com o imperativo da educação, o corpo da
criança é que será o principal objeto do que Foucault nomeia “ortopedia
discursiva”. Compreende-se que a partir da Revolução Industrial, com
a aliança cada vez mais estreita entre a Ciência e o Capitalismo, e
sobretudo após a Segunda Guerra, o corpo passou a ocupar um lugar
central, confundindo-se com o indivíduo. Destaca-se o quanto o próprio
corpo torna-se objeto de consumo, numa época em que, como sublinha
Lacan, constatamos “a segregação trazida à ordem do dia por uma
subversão sem precedentes” (LACAN, 1967/2003, p. 361).
Palavras-chave: corpo; discursos; psicanálise; segregação.
Abstract: This article is based on Lacan’s four discourses to show that the
social bond between human beings is actually an “incarnate bond,” since
the human body is also a fact of discourse. However, such “incarnate
bond” is not without conflict inasmuch as it implies relationships of
power resulting in domination and separation. The continuum between
body and cosmos is shown in the Middle Ages, wherein the Discourse of
the Master used to prevail. It is suggested that, during the Renaissance,while such discourse changed to the Discourse of the University, the
body of the woman put up a fight, which is evidenced by the social
symptom of strings of bodies burning at the stake of the Inquisition. It is
shown that, as from the 17th Century, with education as an imperative,
the body of the child would become the chief target of what Foucault
named “discursive orthopedics.” It is understood that, starting with the
Industrial Revolution, with an increasingly close-knit alliance between
Science and Capitalism, and, most of all, after World War II, the body
began playing a key role while entangling itself with the individual. The
extent to which the body becomes an object of consumption at a time
when, as Lacan underlines it, “separation [is] put on the agenda by an
unprecedented subversion” is stressed.
Keywords: body; discourses; psychoanalysis; separation.
Biografia do Autor
Ana Laura Prates Pacheco, FCL-SP
Psicanalista, A.M.E. da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano – Fórum São Paulo.
Coordenadora da Rede de Pesquisa de Psicanálise e Infância do FCL-SP.
Doutora em Psicologia Clínica pela USP.