A vagueza e a ontologia da arte são duas questões espinhosas. Embora muito trabalho original tenha sido conduzido no século XX no domínio da ontologia da arte, tentando esclarecer a natureza de uma obra de arte, suas condições de identidade e individuação e o estatuto de propriedades teóricas, também houve alguma suspeita sobre a relevância dessas reflexões ontológicas que parecem nos levar muito longe de experiências estéticas, práticas artísticas e das próprias obras. No que tange à vagueza, ela é com freqüência vista como uma mera noção semântica ou epistêmica, e a alegação de que poderia haver objetos vagos, nomeadamente, vagueza ôntica, é muito raramente considerada como uma opção séria.Entretanto, se a aparente falta de fronteiras, quaisquer que sejam suas fontes, é característica de vagueza, a arte pareceria ser, prima facie, um dos domínios que poderiam ser mais hospitaleiros à vagueza. Mas se há fortes razões contra fazer a vagueza ôntica ter sentido, nossas intuições prima facie podem ser tão dificilmente sustentáveis aqui quanto em qualquer outro lugar. Há uma maneira de evitar tais conclusões? Ver a vagueza não somente como uma propriedade objetiva, mas também como um constituinte irredutível da realidade e, como tal, da ontologia da própria arte? Seguindo alguns insights originais oferecidos por Ch.S. Peirce, na virada do século XIX para o XX, sobre a semiótica, a epistemologia e a ontologia da vagueza, sugerirei que esse caminho existe, e que ele pode até mesmo ajudar a favorecer alguma forma de realismo da vagueza na arte.