Irineu Claudino Sales
Mestre em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Contato: claudino.i.sales@gmail.com
O Autor (A.) Moisés Sbardelotto é graduado em jornalismo, possuindo mestrado e doutorado em Ciências da Comunicação, tendo pós-doutorado em Ciências da Comunicação e Ciências da Religião. É escritor de vários livros e artigos, é palestrante e também tradutor. Atualmente é professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas).
O primeiro capítulo da obra, intitulado Uma Igreja sinodal digital? Introduzindo a reflexão, funciona de fato como uma introdução e apresenta o caminho a ser percorrido. O A. se refere ao Sínodo sobre a Sinodalidade como o “Sínodo digital”. Na proposta de uma Igreja Sinodal “os ambientes digitais adquirem uma relevância muito significativa frente ao desafio de ‘caminhar juntos’ em missão, em comunhão e participação” (p. 19-20). É apontada nesta parte da obra a inspiração do seu título Missionários no ambiente digital, que se trata de um dos vinte capítulos do Relatório de Síntese do Sínodo. A obra tem como objetivo explicitar um “discernimento das possibilidades e também dos limites, tanto do ponto de vista da cultura digital em geral, quanto da atuação dos ‘missionários digitais’ em particular, segundo uma perspectiva sinodal da Igreja” (p. 20).
O segundo capítulo tem como título A missão da Igreja: comunicar a Boa Nova. É um capítulo rico em conteúdo missiológico, partindo do magistério eclesial nos apresenta uma compreensão atualizada do conceito de missão. “A missão cristã é a mesma, onde quer que estejamos, quando quer que seja. Em redes digitais ou não” (p. 23). O A. relembra: “Não há evangelização nem Igreja sem a ação do Espírito” (p. 28). A missão cristã é destacada como anuncio da Boa Nova enquanto ação de “alcance inevitavelmente social, pois a vida comunitária e o compromisso com os outros está no próprio coração do Evangelho” (p. 32). Os discípulos-missionários exercem o papel de mediadores e não “intermediários” burocráticos e interesseiros, ou “controladores da graça”, na relação entre Deus e as pessoas.
Com o título Ambientes digitais: reconhecendo o território o terceiro capítulo nos faz mergulhar no ambiente digital, que é considerado “como um dos ambientes diversos que habitamos” (p. 40). São apresentados dados sobre a quantidade de usuários da internet no Brasil; denuncia-se a questão dos oligopólios digitais ou “latifúndios digitais” controlados por poucas empresas. Afirma-se que o poder e o interesse econômico dessas plataformas digitais são enormes, sendo alimentados pela chamada economia da atenção, que disputa a atenção humana nos ambientes digitais. Nesse processo “as pessoas são transformadas em usuárias; de usuárias, em consumidoras; e de consumidoras, em verdadeiros produtos” (p. 49). O capítulo explica a existência no ambiente digital da não neutralidade, do espaço público-privado, dos efeitos prejudiciais sobre a saúde mental das pessoas, do risco de “manipulação das consciências e do processo democrático” (p. 47-48).
No capítulo quatro, A missão da Igreja em tempos de “Reforma digital”, o A. faz um comparativo do momento atual, que ele define como “Reforma digital”, com a Reforma Protestante no século XVI. A “Reforma digital” é “uma revolução sociocultural, a partir das transformações digitais, que está provocando uma revolução religiosa” (p. 54). O A. buscando seu referencial no Relatório de Síntese do “Sínodo digital”, apresenta as seguintes propostas para a Igreja: criação de um marco jurídico do Direito Canônico para reger as ações evangelizadoras no ambiente digital; promoção do vínculo entre os evangelizadores digitais e a comunhão com o papa e as igrejas locais; uma pastoral digital que seja capaz de superar a “mera concepção de ‘instrumentalidade’” (p. 63).
Já o quinto capítulo, A missão nos ambientes digitais, segundo nossa opinião é o coração do trabalho apresentado. Nele o A. discorre sobre a influência do mundo digital na vida concreta da Igreja, revelando luzes e sombras e apontando possibilidades de caminhos para a evangelização. Diante dos desafios postos pela nova fronteira missionária digital o A. revela três saídas possíveis de serem desenvolvidas: contenção, legislação, educação. “É preciso investir, portanto, na formação digital e teológica das pessoas e comunidades locais, para que saibam reconhecer o que é bom e verdadeiro nas práticas digitais (católicas ou não) e também lidar com elementos exógenos” (p. 77). O missionário digital não pode “realizar uma missão alone together” (p. 80), e precisa se lembrar que “todo missionário não deixa de ser discípulo e sempre deve voltar a se colocar ‘atrás’ de Jesus, no seguimento de seus passos” (p. 92). Na missão da Igreja a proposta não é de venda de um produto, mas de anúncio do Reino de Deus. “A adesão do coração por parte de quem recebe a nossa comunicação é crucial, mas permaneceria ‘abstrata e desencarnada’, sem a manifestação concreta da participação visível em uma comunidade de fiéis” (p. 95).
Com o título A missão cristã no ambiente digital como anti-influência digital, o sexto capítulo de modo profético e inovador afirma que a missão cristã deve proceder como anti-influência digital. “Paradoxalmente, percebe-se que é possível ser um ‘influenciador digital católico’ sem ser, necessariamente, um evangelizador ou missionário digital. Pois, quando a inspiração para a missão não é o Jesus do Evangelho e o Evangelho de Jesus, acabamos copiando práticas mundanas do mercado da comunicação” (p. 100). Um influenciador digital facilmente pode cair em contratestemunhos devido às tentações da necessidade de visibilidade, futilidade, falsidade e agressividade. Um missionário digital “age de modo contracultural” (p. 102). O A. lembra que o missionário digital é seguidor do Crucificado, e é chamado a ser sinal de contradição “em meio àquilo que impera no mercado da comunicação digital” (p. 105).
O método Emaús é o título do sétimo capítulo. Com base no relato bíblico do encontro do Ressuscitado com os discípulos (cf. Lc 24, 13-35). O A. demonstra a pertinência e atualidade da Sagrada Escritura revelando o “método” missionário e evangelizador de Jesus. O “método” Emaús pode apresentar vários indicativos que podem auxiliar na evangelização no ambiente digital. Com o “método” Emaús percebemos que o “estilo de Jesus é a prática encarnada do amor e do serviço ao próximo” (p. 119).
No último capítulo, Para continuar o caminho, temos a conclusão. O A. retoma que “todo missionário não deixa de ser discípulo e sempre deve voltar a se colocar ‘atrás’ de Jesus” (p. 124). Retoma ainda aquilo que ele define como “primazias da missão nos ambientes digitais” (p. 124). Em primeiro lugar se recorda a primazia do Evangelho. O “missionário comunica uma ‘Boa Nova’” (p. 125). Depois a primazia da caridade, pois o “que inaugura o Reino de Deus neste mundo é justamente o amor” (p. 126). Também a primazia da sinodalidade que convida a escutar, dialogar e caminhar juntos. E por fim, mas não menos importante, a primazia da unidade eclesial, que “é uma primazia fundamental para o testemunho cristão em rede” (p. 127). O A. termina de modo provocador com as seguintes palavras: “E, no caminho da sinodalidade, ainda há muitos passos a serem dados para que a missão certa seja feita no Nome certo” (p. 127).
A presente obra possui um descompasso entre a numeração do sumário com aquilo que o autor expressa logo no início com a sua introdução. De modo palatável o autor apresenta dados, conceitos técnicos do ambiente digital, o que facilita a leitura e instiga a curiosidade do leitor. Colhendo as intuições do “Sínodo digital” o A. reafirma de modo corajoso a missão cristã como anti-influência digital. Sendo fiel ao Evangelho no ambiente digital o discípulo missionário se torna um evangelizador digital, que testemunha a Boa Nova de Jesus e conduz para vida comunitária. A obra apresentada é indicada a todos que queiram aprofundar a reflexão sobre formas autênticas de evangelizar no ambiente digital atual, sem perder a fidelidade ao Evangelho.